Gustavo estava já sentindo dor de tanto chorar. Literalmente e figurativamente. Não podia se perdoar por ter matado seu amigo Pedro, estava arrasado... Havia decidido enterrar o mesmo, lhe dar uma morte digna. Poderia ser que morresse o fazendo? Poderia... Mas quem sabe este não seria um castigo dado pelos céus por ter ferido seu compatriota? Com as próprias mãos, brancas e pequenas, esforçou-se para cavar um buraco no qual o amigo coubesse. O jogou lá dentro, uma lágrima escorreu de seus olhos.
- Aaaaaaaaai... - começou, pondo uma palma da mão de encontro a outra, como se estivesse rezando em frente à "tumba". - De mim chorona, chorona de azul celesteeeeeeeee~
A voz de soprano soava angelical, e podia ser escutada não muito longe dali. Lugar este onde se encontrava Vinícius, biólogo que já havia encontrado um sagui assim que saiu da sala de início. Este repousava sobre seu ombro, o capixaba segurava com força uma maleta com biscoitos Cream Crack e um rolo de cozinha dentro. Ao ouvir a voz de Gustavo, sem saber que era dele, ficou encantado... Era como se precisasse encontrar de quem vinha aquela melodia divina.
Ainda que eu pague com a vida, chorona
Não deixarei de querer-te...
Seguiu o som como se não houvesse amanhã, andando a passos largos.
Eu subi ao pinho mais alto, chorona...
Pra ver se te encontrava
Aproximou-se do local, vendo um jovem de frente para um buraco que parecia fundo, no chão. Suspirou, meio chateado. A imagem que tinha de uma possível dona daquela voz era completamente diferente... Ao ouvir outra pessoa aproximando-se, tratou de se esconder atrás de uma árvore.
- Amei sua voz, poc. - disse Felipe, que carregava um taco de beisebol acima dos ombros. Infelizmente já havia devorado seu pão com ovo, e estava morrendo de fome. Gustavo olhou para ele, ainda com lágrimas nos olhos. Gostava de ser elogiado, mas estava muito triste pela morte de Pedro. Felipe chegou mais perto, olhando para o buraco no chão. - Ai que morte horrível.
- Vinhado, por que não continuou cantando? - Andy fez-se presente, com um sorriso no rosto. Deu mais uma mordida em seu salsichão e se aproximou dos outros dois. - Mores vocês vão ficar olhando pro defunto? - perguntou, dirigindo-se até a terra que foi tirada e a empurrando com a pá que havia recebido como arma. Vinícius ouvia tudo muito intrigado... Queria correr, mas não podia fazer barulho ou poderiam notá-lo ali. E se o matassem? Suspirou fundo, suando frio. Não sentiu mais o peso em um dos ombros, notou que seu sagui não estava mais lá... Arregalou os olhos. Então, pôs a cabeça para o lado da árvore, tentando ver se o encontrava. O animal se aproximou de Andy, foi muito rápido e roubou seu salsichão. - MACACA DESGRAMADA. - berrou, indo atrás do que lhe pertence com a pá em mãos. Vinícius não pensou duas vezes e se mandou dali, visto que o sagui o seguia.
Olhou para trás para ver se ainda era seguido e tropeçou na raiz de uma árvore, caindo de cara no chão. Sentiu patinhas tateando por suas costas, e por fim em sua cabeça... Iria levantá-la, mas sentiu uma pancada muito forte no local. Andy soltou um grito tão agudo que daria até inveja em Gustavo com seus falsetes. Havia até se esquecido do seu salsichão roubado, caiu duro no chão com a visão da cabeça de Vinícius sangrando.
Restam 15 participantes.
- E-Ele vai ficar bem? - perguntou Gustavo, preocupado. Felipe deu de ombros, nenhum dos dois sabia da gravidade do que tinha acabado de ocorrer.
- Sei lá, daqui a pouco volta. - disse, começando a empurrar a terra para dentro do buraco com os pés. - Tem comida? - perguntou olhando para Gustavo, que ficou mudo e negou com a cabeça. Chegava a suar frio, tudo aquilo estava o deixando com muito medo. Não sabia o que os outros podiam fazer com ele, poderiam querer matá-lo a qualquer momento. Se sentia péssimo por ter matado, mas também não queria morrer... Teria que agir.
- Podemos procurar frutas ou animais pequenos, só me ajude a enterrar o Pedro. - esforçou-se ao máximo para não gaguejar. Assim Felipe o fez, e quando o mesmo estava de costas, Gustavo tratou de pegar seu arco e flecha. Tremia, e estava com medo de errar, mas precisava tentar. Mirou na direção da cabeça do carioca, mas na hora em que foi disparar... O mesmo se mexeu. O dono da voz angelical se tremeu todo ao ver Felipe vindo para cima de si com o taco de beisebol. Antes mesmo que chegasse a apanhar, caiu duro no chão. Para ter certeza de que não se levantaria, o carioca acertou sua cabeça uma, duas, três vezes. Sentiu seu estômago roncar, e foi até a maleta de Gustavo checar se não havia mais nada. Bufou ao ver só uma caixinha de Ades vazia. Retornou, pegou o arco com algumas flechas que estavam no chão e optou por seguir seu caminho.
- É pelo Tom... É pelo Tom... - andava e repetia para si mesmo, falando baixo. O peso na consciência vinha, mas para a vitória das poc valeria a pena.
Restam 14 participantes.
Ao sul da ilha, o aniversariante do dia devorava biscoitos de polvilho encostado em um tronco de árvore, a espada que havia ganhado estava ao seu lado, no chão. Não havia ninguém por perto, aparentemente. André estava tendo mais uma de suas crises de bad no aniversário, e como as odiava... Passar o aniversário ali era a última coisa que desejava. Queria era estar em casa debaixo do edredom de conchinha com seu @. André deu um pulo de susto ao sentir um toque em seu ombro, quase gritando. Nesses raros momentos é possível vê-lo abrindo os olhos.
- Parabéns. - falou a outra carioca presente na ilha, sorrindo. Havia passado por trás da árvore na qual ele se recostava, sem que o mesmo notasse.
- BETÂNIA VOCÊ QUER ME MATAR? - disse, indignado e com uma das mãos no peito.
- Perdão, more. - ela sentou-se do seu lado, pegando seu pacote de Trakinas para comer.
- Pensei que ia morrer. Não faz isso, Beatrícia. - André suspirou fundo, encostando na árvore novamente. - É meu aniversário, queria a bebida que pisca.
- Quando voltarmos, eu te levo no Rio e tomamos umas. - arrumou seu soco inglês na mão direita, de modo que o mesmo não atrapalhasse.
- Beatriz, afasta isso. - chegou um pouco pro lado, com medo.
- Não quero matar ninguém não, meu anjo. - sorriu. - Mas se me atacar, eu vou atacar.
- Deus me livre. - ele sacudiu a cabeça para um lado e para o outro, sinalizando que não o faria. - Mas como vamos sair daqui? Estamos presos.
- Pra tudo tem um jeito, chuchu.
Ao norte, dois rapazes aqueciam-se com a ajuda de uma fogueira. Estavam de barriga cheia, o único problema é que o afastamento do fogo por um segundo sequer já era o suficiente para sentir frio. Estava anoitecendo, e nesse hora a temperatura começava a cair. Haviam pego alguns peixes no lago próximo na mão mesmo, já que não havia vara de pescar.
- Isso aqui deve estar pior do que Curitiba. - disse Mikael, batendo os dentes enquanto tremia. Guilherme também sentia frio, mas podia perceber que seu rosto estava esquentando... Há algum tempo estava observando o amigo de uma forma diferente. Sozinhos, ali... Anoitecendo... Não sabia bem se era certo, mas ele queria.
- Mikael. - chamou, obtendo a atenção do atibaiano. - Eu... - quando ia falar o que planejava, ouviram um rugido próximo. Os dois gelaram ao ver o paraense montado na onça pintada se aproximando.
Continua...